sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Esmalte cor de Pistache

Esmalte cor de Pistache
Flora acaba de sair de uma loja de cosméticos para comprar um esmalte. Sim, um esmalte e um esmalte apenas, afinal, havia meses que estava sem emprego, e precisava de uma coisa para se sentir bem. Ao sair da loja, percebeu que todos olhavam espantados seu guarda chuva quebrado e segurado por ela em uma ponta. Flora não ligou muito para o guarda chuva, só sentiu-se mal por querer comprar algo mais nesta loja e só poder comprar um esmalte com míseros trocados que tinha no bolso.
Flora sabe que não precisa de muitas afirmações na vida que digam quem ela é, apenas está esquecida de uma ou duas coisas que gritam o seu nome, como por exemplo, este esmalte, cor de pistache, uma cor que poucos procuram, mas que quando vêem, todos notam e desejam copiar. Sempre foi assim em sua vida: ela fazia algo ousado, e logo todos outros a copiavam, logicamente, com imperfeição.
Mas o esmalte era de menos, sentia-se pouco mulher, pouco fêmea, estava com uma roupa que usara no dia anterior e estava com o cabelo sujo.Pensou que talvez devesse ressuscitar aquele cartão de crédito que prometera não usar mais,somente em caso de emergência...e acreditem...esta era uma emergência!
Andou,não havia vagas para ela no salão de beleza,foi dar uma volta, entrou no supermercado, comprou a comida para fazer o jantar,e por um momento percebeu que aquele era um cenário frequentemente visitado quando não tinha nada em mente, notou que havia as mesmas pessoas de dias em que esteve lá, e olha que foi mais uma vez na semana.Sentia-se vazia, e quando comprava algo,mesmo que uma pasta de dente,algo dentro de si preenchia, temporariamente.
Saiu de lá, usou antes o dinheiro da poupança que dizia não descontar mais, mas comida era uma emergência. Ao andar poucos metros do supermercado, cansou-se da humilhação do guarda chuva quebrado “de pobre”, e dignamente, jogou-o no lixo, onde um senhor com seu filho olhava sem parar, enquanto ela “encestava” o pobre guarda chuva preto, todo arrebentado.Antes pegar chuva, do que perder a dignidade.
Chegou ao salão, demorou a ser atendida, fez a sobrancelha, e a moça que a atendeu era tão gentil que sentiu-se cuidada por uma mãe.Era só do que precisava: um pouco de atenção e vaidade recuperada.
Sentindo-se melhor, pensou “por que não?” e resolveu cortar o cabelo e ter um motivo para olhar-se no espelho,novamente. Cada tesourada era um mal que saía de si, e que parecia estar impregnado em cada mecha de cabelo. Ao sair do salão agradeceu a todos, especialmente a designer de sua sobrancelha, e nem mesmo uma chuvinha estragou o seu visual, que não estava mais no cabelo, mas dentro de si.
Ao chegar em casa, preparou o jantar as pressas, e não é que deu?Quando o marido chegou, cumprimentou-o com um beijo apaixonado e ele notou a mulher que ali estava escondida em meio a tristeza e esquecimento por parte dela. Flora floresceu, a mulher escondida reapareceu, e graças a um esmalte, cor de pistache, muitas coisas boas vieram juntos neste dia.

Um comentário:

  1. muito bom, muito!

    as mudanças de dentro são importantes, mas as de fora também, ambas as mudanças se completam e nos faz bem, não tem como negar isso!

    muito bom.

    ps. vou te "seguir".

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